Monday, April 10, 2006

Caso 13

Daniel, sentado no seu escritório, pela madrugada, procurava a imaginação que lhe fugia para a elaboração de mais um exame prático, para os seus ansiosos alunos. 'Folheava' os canais da miserável televisão na secreta esperança de um qualquer filme ou série lhe trazer uma ideia luminosa ou, pelo menos o distrair e, deste modo, escamotear da sua mente a ansiedade de não ter ainda cumprido a sua obrigação.
Neste exacto momento deu por si a pensar? Será que um produtor de televisão é um comerciante? E se fosse… poderia a sua firma ser 'um idiota inveterado que de tolo nada tem'?
Ainda imóvel, debaixo da velha manta amarela que o consolava na noite fria, perguntou aos seus botões (abotoados até acima, porque ainda estava em convalescença); se comprasse a Rádio Xap, situada num imóvel de Leonildo, no Centro Comercial do Centro, que nome terá esse contrato, como se deve fazer e que formalidades deveria cumprir.
Nos três canais de tv, numa perfeita sinfonia, desfilavam os mais variados cómicos e ridículos spots publicitários; por ter os olhos na estante, enquanto usava o seu novo pc, deu com ele a pensar: se alguém que tivesse uma empresa que prestasse serviços de informática, poderia denominar os seus serviços de Windows? (sinal distintivo registado em vários países, mas cujo registo inexiste em Portugal).
Como Daniel precisava de dinheiro para ir ao Carnaval do Rio, fez o seguinte: sacou uma letra sobre o seu irmão (que desconhecia a sua existência) e pediu ao seu pai que a avalizasse, dizendo-lhe que era um mero aval de favor, pelo que nunca teria de pagar a mesma. Posteriormente endossou-a à agência de viagens e sorriu: tinha a quase certeza que como não pretendia regressar do Brasil, nunca a letra iria ser paga.

Caso 12

MMM entrou pela primeira vez no Pavilhão das Latas Suculentas em 02 de Setembro último desconhecendo por completo a actividade, munida simplesmente de uma inabalável confiança nas suas intrínsecas virtudes. MMM “era um monstro de feia, com cabelo cor de rena, olhos estreitos, rosto inchado, com excesso de pó-de-arroz, roupas deselegantes num corpo sem graça, mas um encanto de pessoa, digna de confiança como uma santa”(*).
Após se ter informado da complexidade económica, financeira e jurídica da sua empresa, decidiu-se a lutar pela sua sobrevivência.
Consciente da impossibilidade de cumprir pontualmente todas as suas múltiplas obrigações, reuniu com os credores sugerindo que os prazos de pagamento fossem protelados seis meses, ao que estes anuíram, com a concordância judicial.
Para dinamizar a actividade e aproveitando a conjuntura social da sua cidade, na qual os divórcios cresciam exponencialmente, optou por, a par da comida enlatada, disponibilizar aos seus clientes, comida quente para levar para casa; esta iniciativa foi do desagrado do senhorio que sustentava que o trespasse realizado com Gongas estava inquinado, por ter sido dado um destino diferente ao prédio.
MMM é casada com Vítor Vitoriano da Várzea (VVV para os mais íntimos) que, encantado pelo sucesso do Rock in Rio, optou por realizar o Fado na Planície, iniciativa com a qual procurava, não apenas ganhar dinheiro, como reunir os melhores fadistas nacionais com outros músicos tradicionais. Para tanto tratou de arrendar uma ampla propriedade, junto a uma deslumbrante barragem onde três tristes patos se vangloriavam da sua espampanante beleza, cobriu-a de vários palcos, wc portáteis, barracas de farturas e petiscos, alguns divertimentos para os petizes e, qual cereja no bolo, uma tenda para a imprensa, equipada com as mais recentes tecnologias.
Para realizar esta actividade VVV tratou de proceder ao registo da marca Fado na Planície; após o registo, contratou com várias empresas a possibilidade de estas utilizarem a marca para assinalarem os seus produtos ou serviços com o desiderato, cumulativo, de conseguir dinheiro e publicidade.
Uma das principais patrocinadoras da iniciativa foi MMM; por esse motivo, para pagar algumas despesas, VVV criava um documento através do qual obrigava MMM ao pagamento de determinadas importâncias. Um destes documentos, foi criado sem a menção do valor e entregue a Úrsula (titular da empresa encarregue das bebidas alcoólicas) com o acordo de, no final do festival, ser aposto o valor relativo às despesas concretamente apuradas.
Por atravessar um período económico difícil, nomeadamente deficit de liquidez para assegurar o pagamento de salários e impostos, Úrsula colocou no documento o dobro do valor em dívida e entregou-o ao seu fornecedor, Ulisses, que desconhecia em absoluto a irregularidade.
Ulisses, no prazo determinado, dirigiu-se a MMM e exigiu o pagamento; esta, não apenas se esquivou ao pagamento, como recusou realizar o aceite, alegando a desconformidade.
(*) Irving Wallace, Os sete minutos, trad. de Milton Persson, Lisboa, Público, 2003, p. 137.

Caso 11

Estava um dia absolutamente invernal, com uma chuva intensa que não dava descanso aos transeuntes incautos que haviam menosprezado a extrema necessidade de guarda-chuva. Na varanda, perto do velho aquecedor que tentava enganar o frio, o Detective Gongas contemplava com rancor os funcionários da empresa de leasing, enquanto estes carregavam todo o material do seu escritório, por motivo de não pagamento.
A tragédia financeira da sua actividade fez Gongas concluir pelo óbvio: era o momento de mudar de actividade. Por impulso, decidiu rumar ao Algarve, passar uns dias na casa do seu amigo ZéZé e procurar uma nova actividade.
Num dos seus passeios nocturnos deparou-se com uma decrépita fábrica de comida enlatada, no exacto momento em que uma estrela cadente atravessava os céus; este facto fê-lo recordar pelo seu juvenil gosto culinário e, arrastado pela mística combinação de factores, decidiu-se a dedicar o resto da sua vida à nobre causa da comida enlatada. Para tanto, tratou de negociar com o dono da fábrica a sua aquisição, o que sucedeu, pouco tempo depois, num contrato celebrado no Cartório Notarial de Albufeira, em escritura pública em que ZéZé compareceu, na qualidade de fiador, para grande desgosto do senhorio, que desejava a fábrica para si.
Gongas escolheu para se designar o nome civil do antigo proprietário, aditando-lhe a expressão O Rei da Sardinha Enlatada, para denominar a sua fábrica Pavilhão das Latas Suculentas e para comercializar os seus produtos Chef Cuisine Dupont.
Com o intuito de modernizar a sua fábrica Gongas contratou mais funcionários, comprou dois automóveis, uma casa para habitar perto da fábrica e adquiriu algumas máquinas, tendo contraído um empréstimo para realizar estas operações.
Estranhamente, os lucros foram inferiores às elevadas expectativas de Gongas: a situação piorou quando um credor do antigo dono da fábrica, confrontou Gongas com a necessidade de pagar 10.000,00 Euros de matérias-primas, entregues na fábrica, 15 dias antes de Gongas a adquirir.
Nesse mesmo dia Gongas, receando as dívidas que acumulou, decidiu que o Algarve não era ideal para si: pelo mesmo valor que adquiriu, alienou, por documento particular, a fábrica a Manuela Madalena Maria. Por a transacção ter sido muito rápida MMM (como era conhecida pelos seus amigos) desconhece exactamente o que comprou, nomeadamente se o imóvel lhe pertence, se é proprietária da marca e se está obrigada a pagar as dívidas contraídas pelos anteriores proprietários.
QVID IVRIS

Caso 10

Desde criança Susana sonhava em ser bailarina, de forma a poder interpretar as mais românticas coreografias. Ainda usava vestidinhos cor-de-rosa com folhos, com compridos caracóis que adorava enfeitar com os malmequeres que colhia na planície e já fitava deslumbrada os espectáculos culturais que preenchem os horários nobres das nossas televisões. Para sua enorme decepção, as poucas aulas de bailado que frequentou demonstraram que a sua principal aptidão não era a dança. Ainda assim, guiada pelo sonho e fantasia trocou as sapatilhas pelos livros, tornando-se uma estudiosa de coreografias de bailado.

Para prosseguir o seu sonho não hesitou em criar a sua companhia de dança. Para tanto celebrou um contrato com Sónia pelo qual lhe adquiriu uma galeria de arte, na qual existiu um auditório com capacidade para cem pessoas. Porém e porque Sónia era a sua mais intima amiga, este contrato foi celebrado apenas oralmente.

Entretanto e para angariar fundos para o espectáculo de dança, organizou uma exposição de pintura, em que expunha e vendia quadros de quatros artistas locais: um destes era Leonardo, um galã de origem italiana. Encantada, a nossa heroína – Susana – tornou-se fã da obra e do artista, tendo adquirido todos os seus quadros. Este negócio teve consequências ruinosas no património de Susana, que deixou de ter capacidade para cumprir as suas obrigações de forma irremediável. Ao tomar conhecimento da precária situação financeira de Susana, Leonardo deixou de responder aos seus telefonemas, e-mails e sms, tendo assumido uma relação sentimental com um modelo húngaro.

Os dois anos seguintes foram de penoso sofrimento; mas um dia a tempestade esvaneceu-se e regressou a bonança. Tudo começou num pequeno restaurante na praia da ilha do pessegueiro. Enquanto folheava a Cosmopolitan o seu olhar cruzou-me com o de Miguel alto, moreno, de olhos verdes, ombros perfeitamente delineados e um sorriso que derretia o mais impávido dos corações. Susana tremeu quando os seus olhares se cruzaram… o rosto de Miguel era, indubitavelmente, uma escultura perfeita.

A cumplicidade foi instantânea; nesse mesma tarde, não apenas trocaram os números de telemóvel, como as mais ternas confidências. Miguel era um jovem estilista alentejano que optou por abrir o seu próprio pronto-a-vestir de roupa para homem exclusivamente feita com tecidos de lã obtida de ovelhas criadas no Campo Branco. Para identificar o seu ateliê optou pela designação Versaci Masculini - Roupa do Alentejo e em atenção às carícias de Susana adoptou a denominação de Pura Seda Animal para identificar os seus produtos.

Ao ter conhecimento dos problemas financeiros de Susana, Miguel prontificou-se a aceitar uma letra por aquela emitida, de modo a pagar uma dívida desta a Carlos. Este, mal a recebeu transmitiu-a a Sérgio, que a perdeu numa discoteca. Paulo aproveitou-se do facto de não constar na letra o nome do seu beneficiário para a transmitir a Mateus, que ignorava o percurso da letra. Assim, no dia do vencimento Sérgio confronta Mateus e exige-se a entrega da letra. Mateus fica confuso, sem saber o que fazer...

QVID IVRIS

Caso 9

Estava um dia de Verão, não obstante a Primavera apenas recentemente se ter apresentado. Ao longe o extenso mar azul que se confundia com as nuvens no qual reflectia o sol que começava a despedir-se no horizonte, presenteando quem assistia com um deslumbramento cor de laranja, capaz de saciar o mais requintado dos observadores. Na praia, desfilavam alguns surfistas, aproveitando a breve aragem que anunciava o fim da tarde; no amplo areal, algumas, poucas, pessoas usufruíam do sol e procuravam o prazer de um banho salgado ao fim da tarde; mais ao longe, deambulando pelos pequenos rochedos esculpidos pelas mares, um casal de namorados passeava de mãos unidas sonhando com as vicissitudes do futuro. Foi nesta praia que Fernando deu os primeiros passos, nas férias passadas em casa dos avós.

O avô de Fernando, Manuel era um velho homem, feliz, que anos antes abandonara a vida cosmopolita para procurar refúgio numa pequena aldeia esquecida, privilegiada com uma deslumbrante vista sobre o oceano. Para fazer face às suas despesas Manuel construiu um viveiro de marisco, fornecendo alguns restaurantes da região. Enquanto isso, a sua esposa dedicava-se ao jardim da casa, no qual plantava as mais belas flores, para gáudio dos muitos que as recebiam como ofertas. Nesta tarde, a avó Maria havia saído, deslocando-se a Santiago do Cacém para adquirir alguns produtos para a sua actividade de jardinagem.

Manuel passava parte dos seus dias com os seus grandes amigos Pedro e João; Pedro, um reputado retratista, cujos quadros engalanavam alguns dos mais luxuosos palacetes da nobreza europeia; João, foi durante anos proprietário de uma marisqueira, onde românticos casais se deliciavam, com as melhores iguarias da costa alentejana. Como sua firma adoptara Carlos Osório de Albuquerque, o Carapau, em homenagem ao seu pai, a pessoa que a havia constituído e posteriormente lhe transmitira a marisqueira. (Carapau era o nome como o pai de João, Carlos, era conhecido na aldeia, depois de anos a dedicar-se à pesca). Para cumprir todas as suas obrigações, aproveitou o facto de estar em Lisboa, para tentar realizar o registo comercial.

A marisqueira estava entregue aos cuidados de Francisco, que realizada todos os actos e contratos necessários, uma vez que João era um eterno romântico que fazia da leitura uma ocupação integral, não tendo nem tempo, nem paciência, nem talento, para os problemas mundanos da marisqueira.

Um dia João casou, já depois de ultrapassadas as sessenta Primaveras. A esposa escolhida foi uma discreta brasileira que conheceu por um chat na Internet. Pode mesmo afirmar-se ter sido amor à primeira vista, porquanto mal João a viu pela sua webcam, enviou por correio um sumptuoso anel, acompanhado de um apaixonado pedido de casamento, bem como de um bilhete de avião, em primeira claro...

A passagem de Mónica (era este o nome da esposa brasileira) na vida de João foi efémera no tempo mas proficiente nas consequências. Arguindo não se sentir adaptada, induziu o seu submisso marido a oferecer-lhe um salão de cabeleireiros; com os alegados lucros do salão, adquiriu variadíssimas jóias bem como sumptuosas peças de decoração para o salão. A ardente paixão de João não se esvaneceu quando os primeiros credores de Mónica começaram a procurar a sua porta, acreditando em todas as mal contadas histórias da sua esposa.

Só algum tempo mais tarde João enfrentou a penosa realidade. A sua idolatrada esposa havia fugido na companhia de um turista alemão, que nesse Verão passara férias na aldeia. Para trás deixara um coração destroçado e uma montanha de dívidas; destas destacam-se uma para com Belchior de € 20,000.00, relativa a um empréstimo para as obras do salão (embora não existisse nenhum documento a comprova-la), outra de € 5.000,00 do pronto-a-vestir que Mónica frequentava e outra de 7,500,00 contraída num negócio com Marta.

Vergado pelo desespero e pela vergonha, João tornou-se taciturno e distante sendo sem surpresa que uma manhã foi encontrado morto, preso à azinheira que assistiu aos seus últimos suspiros. Fernando ouviu várias vezes o avô a contar esta história, no alpendre com vista para o mar: era a sua forma de ensinar ao neto a importância das escolhas individuais.

QVID IVRIS

Caso 8

Das nuvens carregadas caiam as primeiras lágrimas naquela primeira manhã outonal. Viriato, escondido entre grossos troncos das palmeiras, avistava ao longe um triste barco que velejava lentamente nas águas calmas. A dor corrompia-lhe o peito, atravessado pelo ardor dos remorsos. Enquanto recordava os últimos anos, as lágrimas de chuva encharcavam-lhe o rosto atingindo-o no coração.

O triste fado dos irmãos iniciou-se quando Viriato persuadiu o seu velho pai a deixá-los expandir a sua pequena retrosaria, denominada de Confecções Maravilha. Para alcançar esse objectivo, realizaram com Bráulio um contrato pelo qual este se vinculava a celebrar negócios jurídicos em todo o Algarve, entre o Pai de Viriato e diversos comerciantes da zona.

Este acordo que durou três anos, permitiu que As Confecções Maravilha se tornassem muito conhecidas em todo o Algarve, triplicando o seu volume de vendas.

O sucesso deste empreendimento motivou os irmãos a continuarem o projecto de expansão da empresa do seu pai. Aproveitaram que o contrato com Bráulio estava a terminar para dispensarem os seus serviços sem lhe pagarem qualquer importância.

A nova estratégia de expansão da empresa, teve como objectivo primordial a abertura de novos estabelecimentos comerciais em todo o país, mantendo o estilo do original e de acordo com as estritas indicações do proprietário das Confecções Maravilhas. Como não tinham dinheiro para este investimento, optaram por celebrar vários contratos, com diversos interessados, nos quais estes se obrigavam a realizar estes investimentos e a explorar por sua conta e risco estes estabelecimentos.

Para que o estabelecimento fosse conhecido em todo o país, Viriato persuadiu o seu irmão e pai a desenvolverem uma enorme campanha publicitária, quer na televisão, quer nas mais ouvidas rádios do país.

Como este investimento não teve retorno a empresa do pai de Viriato e Inocêncio deixou de ter capacidade para saldar os seus compromissos, acumulando em poucos meses elevadíssimos prejuízos, que condenaram irreversivelmente a empresa. Para evitar que os seus bens fossem penhorados pelos credores, o pai doou-os na sua totalidade aos filhos.

Quando a empresa foi encerrada, Viriato, que gastara rapidamente todo o dinheiro sonegado, aventurou-se na compra e venda de televisões; mas também nesta actividade acumulou prejuízos; confrontado pelo seu credor Gonçalo, assinou o documento em que este lhe exigia que pagasse a quantia em dívida a Ricardo, não sem antes Inocêncio garantir o pagamento pelo seu irmão.

Ricardo, porque também necessitava urgentemente de dinheiro, transmitiu este documento a Evaristo.

Evaristo, vencido o prazo estabelecido procurou sem sucesso o obrigado ao pagamento que, sabendo não poder cumprir havia fugido para uma pequena e esquecida aldeia de pescadores.

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Caso 7

Andreia conheceu Sebastião numa húmida manhã de nevoeiro, no momento em que se cruzaram no adro da igreja matriz. O olhar de Andreia depositou-se nas mãos grossas e rudes de Sebastião, que orgulhosamente patenteavam as feridas conquistadas nas longas noites que passava no estúdio, onde esculpia as suas obras.

Sebastião era natural de uma aldeia escondida numa serra fria, demasiado pequena para um jovem sonhador. Assim, mal fugiu das saias da sua esmerada mãe, o jovem artista dedicou-se a percorrer o mundo com os parcos lucros da venda das suas esculturas.

Andreia era a antítese de Sebastião. Única filha de uma nobre família, residia na Quinta da Marinha, tendo desde a tenra idade dispensado todos os esforços dos seus pais para lhe proporcionarem a melhor formação que o dinheiro pode assegurar. Hoje, com dezanove anos, continua a ser frequentadora das festas mais elitistas: profissionalmente diz ser agente de jovens artistas, embora toda a linha de Cascais não desconhece que esta actividade acumula prejuízos financeiros.

Quando se conheceram, rapidamente se tornaram inseparáveis, numa amizade que de tão intensa aguçava a curiosidade das “linguas mal faladoras”. Não demorou muito a que o irresistível charme de Sebastião atacasse a carteira do pai de Andreia, que se prontificou a emprestar-lhe o dinheiro necessário para este adquirir a Bernardo uma velha galeria de arte, mal situada no bairro alto, repleta de dívidas, cujo pagamento Sebastião jurou honrar.

Em homenagem ao seu artista plástico favorito, denominou a sua galeria de Picasso, tendo optado por manter a denominação do antigo proprietário da galeria como seu nome comercial.

Não obstante a rentabilidade da galeria ser muito reduzida, Sebastião conseguia sobreviver com estes rendimentos; sempre que a galeria apresentava alguns lucros, o seu proprietário apressava-se a realizar dispendiosas viagens pela Europa, com o pretexto de procurar novas obras para expor. Nessas viagens, não apenas adquiria obras artísticas, como livros e presentes caros para oferecer às suas mais intimas amigas.

Foi numa dessas viagens que Sebastião conheceu Paola, uma italiana indescritível, jovem estilista, de talento profissional por provar, mas cuja beleza lhe abrira as portas dos melhores pronto-a-vestir de Milão, onde as suas peças eram vendidas com a denominação de Rol Roice.

A paixão cegou Sebastião, que se apressou a celebrar por escritura pública um contrato com Dinis, através do qual este explorava a galeria, transferindo-lhe mensalmente para a sua conta uma determinada importância, durante o período de dois anos.

QVID IVRIS